quinta-feira, 24 de fevereiro de 2011

Mulheres, Comida e Deus


A gula é sem dúvida, o mais comum dos 7 pecados capitais atualmente. Recém-lançado no Brasil, o livro Mulheres, Comida e Deus da autora norte-americana Geneen Roth (Editora Lua de Papel) aborda de maneira interessante, como nunca havia lido a respeito antes, a relação entre o que comemos e o que pensamos sobre nós mesmos, especialmente nós mulheres.
Para ela, a relação doentia com a comida, que hoje em dia atinge muitas pessoas, inclusive eu desde pequena, está ligada ao fato de em algum momento de nossa infância termos relacionado comida com amor e afeto.
Infelizmente, muitas mães só conseguem demonstrar carinho e amor pelos seus filhos no momento em que os amamentam o que criaria na criança esta associação. A vida agitada, a tripla jornada, o estresse ou até o desinteresse mesmo pelo filho, não importa o motivo, mas segundo a autora, se a criança não recebe amor, carinho e atenção em nenhuma outra parte de seu dia (ou pelo menos não naquela intensidade do ato de amamentar/alimentar) ela fatalmente terá tudo para ser um adulto viciado em comida.
E há de ser verdade pois quem é obcecado por comida, o é desde a infância. Eu não conheço ninguém que tenha se tornado viciado em comida aos 20 anos.
Eu achei isso tão verdadeiro que passei a enxergar a minha necessidade obsessiva por comida (especialmente doces) de uma outra maneira. Meu caso é clássico: a mãe que não consegue amamentar (ou acha que não consegue, que não tem leite suficiente, ou não gosta mesmo de amamentar) tenta dar uma mamadeira à filha, a pequena Adrianinha. Mas esta sabiamente o que faz? Rejeita! Existe coisa melhor do que o peito da mãe quando somos bebês? A mãe espertamente adoça o leite com um pouco de açúcar! Pronto! Danou-se! 35 anos depois e o que temos? A criatura aqui que vos escreve absolutamente viciada em açúcar!
E o mais interessante da história é que, no meu caso, a relação comida-amor realmente se estabeleceu pois minha mãe sempre muito ocupada, não tinha muito tempo para me dar a atenção que eu precisava. Apenas na hora das refeições!
Chegando cansada do trabalho? Que tal fazer um brigadeiro e comer com colher? Brigou com o namorado? Nada melhor que uma taça dupla de sorvete com chantilly! Sentindo-se só? Nada melhor que uma lata de leite condensado para acompanhá-la.
Para a autora, o ato de comer compulsivamente e a obsessão na contagem de calorias servem apenas para mascarar sentimentos não revelados. Ela recomenda algumas diretrizes para acabar com a obsessão: 1) coma sentado num ambiente calmo, o que não inclui o carro; 2) coma sem distrações – distrações incluem rádio, televisão, jornais, livros, músicas ou conversas intensas ou excitantes; 3) coma o que o seu corpo quer; 4) coma quando tiver fome;  5) coma até ficar satisfeito; 6) coma com alegria, gosto e prazer; 7) coma como faria na presença de outras pessoas.
O mais interessante, contudo,  é o que a autora propõe para se livrar do mal. Primeiramente, é preciso reconhecer o problema e conscientizar-se de sua origem, o que o trouxe à tona, em que momentos esta obsessão aparece e fazer maciço investimento em outros prazeres, para que estes possam “substituir” aquele. Em segundo lugar, ela sugere, como mostram as diretrizes,  que se coma tudo o que se quiser e der vontade pois a maioria das pessoas obsessivas por comida armazena o sentimento de que é preciso comer tudo até acabar, até não poder mais pois, sabe-se lá quando será possível fazer isso de novo (no dia seguinte, chegando do trabalho, nós sabemos!).  E só depois, será possível limpar a mente desta obsessão por comida!
Como é que é? Comer tudo que quiser até não poder mais?
Estaria a autora sugerindo o  suicídio para quem é viciado em comida? 

Bom, de qualquer forma, ela usa argumentos bem fortes (leia um trecho do livro abaixo)  para justificar tal recomendação e eu sugiro fortemente a leitura de Mulheres, Comida e Deus para quem se interessa pelo assunto.
Segue um trecho do livro:

Não se trata do peso. Na verdade, nada a ver sequer com comida

Alguns anos atrás recebi uma carta de alguém com uma faixa dos Vigilantes do Peso que dizia: "PERDI QUATRO QUILOS". Logo abaixo dessa frase, ela escreveu: "E ainda me sinto uma droga!"
Nós pensamos que nos sentimos péssimas por causa do peso. E como as juntas e joelhos doem, e não conseguimos caminhar três quarteirões sem perder o fôlego, é provável que estejamos péssimas fisicamente. Mas se passamos os últimos cinco, 20, 50 anos obcecadas com os mesmos cinco ou dez quilos, há mais alguma coisa errada. Algo que não tem nada a ver com peso.

Minha amiga Sally foi a um casamento na Finlândia alguns anos atrás e encontrou uma prima distante que estava furiosa comigo. A prima disse que havia lido meus livros, seguido minha abordagem e engordado 45 quilos. Ela me considerava uma charlatã, uma impostora, uma pessoa desprezível. Eu não a culpava. Se eu engordasse 45 quilos acreditando que estava seguindo conselhos de um especialista, também iria querer estrangulá-la. Humanamente, é claro, e com o mínimo possível de dor. Mesmo assim, estrangulá-la. Afinal, foram 45 quilos! Minha resposta para a prima de Sally foi dizer, da maneira mais gentil possível - e com a segurança de milhares de quilômetros de distância entre nós - que eu percebia que ela achava que estivesse me ouvindo, mas eu não defendo que se deva comer por razões emocionais. E engordar 45 quilos significa isso.

A maioria das pessoas fica tão feliz em ler e ouvir alguém cuja abordagem não é centrada na perda de peso, que toma isso como uma licença para comer sem qualquer restrição. "A-há!", elas dizem. Finalmente alguém entende que não tem nada a ver com peso. Nunca teve nada a ver com peso. Não tem nada a ver sequer com comida. "Ótimo", dizem, "Vamos comer. Muito. Não precisamos parar."

A verdade é que não tem nada a ver com peso. Nunca teve nada a ver com peso. Quando se descobrir uma pílula que permita às pessoas comerem o que quiserem sem engordar, os sentimentos e situações que tentaram evitar com comida ainda estarão lá e elas encontrarão outras maneiras inventivas de se anestesiar. No filme "O Feitiço do Tempo", quando percebe que não vai engordar mesmo que coma milhares de tortas, Bill Murray come como se não houvesse amanhã (pois, no filme, não havia). Mas o desafio se dissipou assim que ele percebeu que poderia ter tanta comida quanto quisesse sem as consequências habituais. Quando não existe o desafio, tudo o que sobra é um pedaço de torta. E quando você termina a torta, aquilo que não tinha nada a ver com a torta - mas o que o levou até ela, ainda está lá.
No último ano, recebi cartas e trabalhei com alunas que tinham: Hipotecado suas casas para pagar por cirurgias gástricas e depois recuperaram o peso que haviam perdido;
Emprestado dinheiro - uma boa quantia - de algum parente para fazer uma lipoaspiração para depois descobrir que ainda odiavam suas coxas;
Perdido 40 quilos e estavam tão decepcionadas com o fato de isso não ter resolvido seus problemas que recuperaram os quilos perdidos. E mais.

Não tem nada a ver com o peso. Se descobrissem uma droga que lhe permitisse comer o que você quisesse sem engordar, você encontraria outras maneiras mais criativas de continuar ignorando suas crenças fundamentais. Ou você sente vontade de acordar ou sente vontade de dormir. Ou quer viver ou quer morrer. Não tem nada a ver com peso. Mas também, não é que não tenha nada a ver com peso. Porque a realidade do peso e suas consequências físicas não podem ser negadas. Algumas das pessoas que participam dos meus retiros não conseguem sentar-se confortavelmente em uma cadeira. Elas não conseguem subir por um caminho com pequena inclinação sem sentir dor. Os médicos dizem que correm risco de morrer a menos que percam peso. Precisam fazer cirurgias nos joelhos, nos quadris, cirurgias gástricas. A pressão sobre o coração, rins e juntas é demais para que o corpo possa funcionar corretamente. Por isso tem a ver com o peso na medida em que o peso atrapalha as funções mais básicas, impedindo que façam coisas, que se mexam, que sintam.

A realidade da epidemia de obesidade - 75% dos americanos estão acima do peso - tem recebido ampla cobertura da imprensa. As intermináveis estatísticas, as novas drogas que estão sendo descobertas, a possibilidade de um gene da obesidade - tudo isso está ligado à questão do peso. Ninguém discorda do fato de que estar 40 quilos acima do peso é fisicamente desafiador.

Ainda assim, a questão é que, não importa se a pessoa pesa 70 ou 150 quilos, se ela come mesmo que não esteja com fome, está usando a comida como droga. Está lidando com tédio, doenças e perdas, dor, vazio, solidão, rejeição. A comida é apenas o intermediário, o meio para chegar a um fim. Para alterar as emoções, para deixá-la entorpecida, para criar um problema secundário quando o problema original fica muito desconfortável, para morrer lentamente em vez de enfrentar a vida atrapalhada, surpreendentemente curta. Acontece que o meio para chegar a esse fim é a comida, mas poderia ser o álcool, o trabalho, o sexo, ou crack e heroína. Surfar na internet ou falar ao telefone.
Mas por uma infinidade de motivos nós não entendemos completamente porque (genética, temperamento, meio-ambiente) aqueles que comem compulsivamente escolhem a comida. Não é por causa do gosto. Não é por causa da textura ou da cor. Queremos quantidade, volume. Precisamos de muito para ficarmos inconscientes. Para apagar o que está acontecendo. A inconsciência é que é importante, não a comida.
Às vezes as pessoas dizem: "Mas eu gosto do sabor da comida. Na verdade, eu adoro o sabor! Não estou tendo uma relação íntima, não estou sendo tocada regularmente, não estou sendo massageada. A comida é meu único prazer. Por que não pode ser simples assim? Como demais porque gosto do sabor".
Mas...

Quando você gosta de alguma coisa, presta atenção a ela. Quando gosta de algo - de verdade - dedica algum tempo a isso. Você sente vontade de estar presente o tempo todo.
A compulsão por comida não leva a esse sentimento. Você come e engole e sente um mal estar tão grande, que não consegue pensar em outra coisa além do fato de estar cheia. Isso não é amor; isso é sofrimento.O peso é um subproduto. O peso é o que acontece quando você usa a comida para nivelar sua vida. Mesmo com juntas doloridas, não tem nada a ver com a comida. Mesmo com artrite, diabetes, pressão alta. Tem a ver com a vontade de nivelar sua vida. Tem a ver com o fato de você ter desistido sem dizer isso. Tem a ver com sua crença de que não é possível viver de outra forma - e você está usando a comida para botar isso pra fora sem ter de admitir.


7 comentários:

  1. Oi Dri !!
    Sensacional a forma de pensar desta autora. Confesso nunca ter refletido sobre isto antes.
    Adorei!!
    Valeu.
    Bjos.
    ANA

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  2. Oi Dri.

    Muito legal essa postagem.
    Estou com muitas saudades de vocês...
    Acho que vou comer uma "coisinha"...

    Mando

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  3. Dri
    Gostei e me desesperei ...
    Penso em nossas filhas .
    Não desejo que elas " engulam " as coisas como nós atualmente fazemos . Cada um com sua intensidade mas efetivamente passamos pelas mesmas coisas . Acho que as crianças hoje em dia tem mais problemas do que na nossa época .
    Sabendo de tudo isso acho que tentamos ser um pouco diferentes para que elas consigam ter mais tranquilidade .
    Todo dia tento me superar ... difícil ...

    Bjos Lu

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  4. Nunca fiz essa analogia, mas concordo, na maior parte, com a autora!
    Conheço outras pessoas que sofreram dessa "ausência" materna e hoje estão "fofinhos".
    Isso serve também de alerta para nós, mães: Por vezes, é melhor abrir mão do sucesso profissional e do $$ para cuidar dos filhos e, assim, não nos arrependermos no futuro!

    bjos

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  5. Oi Dri,

    Acredito que essa relação emocional influencie muitas pessoas mesmo, e seja o ponto de ajuste para uma possível solução do problema com o "vício" em comida... Minha relação com comida é diferente, não me considero uma pessoa "viciada" em qualquer tipo de alimento, e o que costumo fazer é simplesmente não ter em casa guloseimas. Mas quando bate vontade de alguma coisa eu como, sem culpa. Meu marido, assim como você, tem a mãe Portuguesa, que vivia enchendo o prato dele com comida e dizendo "come que estás magrinho, tens que comer!" e que o padrão de beleza de toda a família era ser "cheinho". Essa cultura também influencia muito, não acha?

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  6. Oi, Dri! =)

    Gostei bastante do texto! Aliás, você escreve muito bem! Parabéns!
    Acho ótimo termos coisas úteis para ler....Continue escrevendo!

    Saudades de você!

    Um beijo grande,

    Fê Abatepaulo Guimarães

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  7. Bom , comi um saquinho de cookies no carro hj ...
    Tudo errado ... massssssssssssss
    É o que " temos no momento " ...
    Eles eram integrais e sem gordura Trans .... hehehe

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